De regresso em regresso

Manifestação da Rede de Proteção e Resistência contra o Genocídio na av.Paulista contra as mortes de jovens negros provocadas por policiais  - Divulgação
Negros são oito de cada 10 mortos pela polícia no Brasil, aponta Anuário Brasileiro de Segurança Pública (uol.com.br)
https://economia.uol.com.br/colunas/jose-paulo-kupfer/2021/04/19/governo-bolsonaro-aprofunda-maior-regressao-economica-e-social-da-historia.htm

Vinício Carrilho Martinez (Dr)
Professor Associado da UFSCar
Head of BRaS Research Group –
Constitutional Studies and BRaS Academic Committee Member

De regresso em regresso, onde é que vamos parar?
De regresso em regresso, chegamos à regressão.
Diga-se, a pior regressão.
Cesarismo repressivo e, claro, regressivo.
Regredimos em todos os sentidos.
Chegamos em tal inflexão que não sabemos o quanto regredimos.
Ninguém levaria a sério uma afirmação, como: “regresso do regresso”.
É bizarro pensar que a regressão, antes desse regresso de agora, era menos regressiva.
Tudo anda como se houvesse uma contagem regressiva, para o pior.
Mas, o pior é que a contagem regressiva não para.
Daqui a pouco vamos regredir para além do quanto não se supunha ser possível regredir.
Muita gente está regredindo para a vida passada, ou seja, para a morte provocada.
Regredimos para todos os tipos de encantamentos.
Regredimos para o pior encanto, isto é, o desencanto.
Daqui a pouco, sentiremos saudade de uma regressão menos pior.
Sentiremos vontade de avançar para uma regressão menos regressiva.
Já sentimos saudade de qualquer regresso, apontado antes desse.
Parece que regredimos para a pré-Constituição de 1988.
Regredimos a ponto de querer constituir qualquer coisa menos regressiva.
Regresse, por favor, futuro que não veio.
Reinicie entre nós.
Recupere os tempos em que não tínhamos vontade de regredir.
Por favor, regrida para antes de toda essa regressão.Para quando Clara Nunes cantava assim:
Parte, amor, já é noite

“Mas traga de novo o calor
Dos teus beijos pra mim
Que eu sei dar valor ao Regresso
Juro, jamais te peço
Pra ficares, amor”.

Regresse, ó amor antirregressivo.
Eu abdico de toda regressão.
Hoje, agora, é tempo de nós nos constituirmos.

INDIGNAÇÃO

https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2021/04/19/desempregadas-pela-pandemia-mulheres-recorrem-a-prostituicao-em-sao-paulo.htm

Vinício Carrilho Martinez (Dr)
Professor Associado da UFSCar
Head of BRaS Research Group –
Constitutional Studies and BRaS Academic Committee Member

Indigna é a fome
Indigno é o choro do bebê com fome
Indigna é a condenação à miséria
Indigno é esse país
Indigna é a reforma trabalhista, sem direitos
Indigno é o golpe de 2016
Indigna é a moralidade escravista
Indigno é quem não se indigna
Indigna é a fé na ignorância
Indigno é o “cidadão de bem”, abusador
Indigna é a supremacia branca das elites
Indigno é o governo desgovernado
Indigna é a “arminha”, ao invés do leite
Indigno é o genocídio (ops: Democídio)
Indigna é a indignidade seletiva, classista
Indigno é o violador da Constituição Federal
Indignação é o nome da República, a vergonha alheia
Indigna-me tudo isso
Ainda bem, sinal de que estou vivo – duplamente
Afinal, quem não se indigna já morreu
… ao menos para mim

Crônica “anunciada” da Constituição

Vinício Carrilho Martinez (Dr)
Professor Associado da UFSCar
Head of BRaS Research Group –
Constitutional Studies and BRaS Academic Committee Member

Estranha-me a ideia de uma crônica da CF88.

Até porque as crônicas são surreais, pelo gênero literário – quem lê nunca sabe ao certo diferenciar o real da fantasia. É o oposto, digamos assim, das lendas imaginárias e dos artigos ou matérias. A crônica é um gênero que não se amarra a um estilo. A crônica é a carta aberta dos ciganos e sagitarianos? Vejamos.

Faz 20 anos que tento fazer uma crônica e confesso que a valentia vale mais do que o resultado. Para que você tenha uma ideia, já escrevi sobre a falta de ideias ou de assuntos. Até isso você aprende, quando tem que fazer um texto semanal por mais de dez anos. Já adianto que é insuperável a sensação de ver seu nome impresso; mesmo que as
pessoas embrulhem peixe logo depois de ter em mãos o jornal do dia.

Também é legal dizer, a quem ainda esteja lendo, que a crônica tem um aspecto muito bacana e acho que é isso que seduz: a criatividade deve superar os métodos, a precisão dos fatos e os anúncios técnicos. A origem dessa aqui, por exemplo, deu-se no chuveiro. A maioria esmagadora das minhas ideias (boas e más) vem da água. Talvez
como se fosse a água boa e a água suja do banho. Quem sabe.

Chamei de “anunciada” porque, sinto comigo, anunciei-me esse dever (ou vontade) de fazer crônica da CF88 umas mil vezes. Nada como essas coisas de “crônica de uma morte anunciada”. A história e as crônicas já provaram que isso não cola.

Hoje, o bebê, que não desceu pelo ralo com a água suja do banho, sussurrou em meus ouvidos o que gostaria que eu contasse. Como falei, não é tarefa fácil. Aliás, é bem estranho pensar que esse bebê seja uma jovem senhora: balzaquiana. A CF88 tem 33 anos. Comparemos: o Brasil tem 521 anos e eu tenho 56.
Isso me lembrou de mais três coisas. Lembro-me que Carlos Ayres Britto, ministro aposentado do STF, tem um livreto romanceado da CF88: Teoria da Constituição (Rio de Janeiro : Forense, 2003). Deve ser sua crônica anunciada ou poema da CF88:

“Ela consubstancia um tipo tão articulado de unidade que faz lembrar a composição e o sentido de um poema…E tudo isto quer dizer que o poema, como a Constituição, fala pelas palavras nele grifadas e ainda fala por palavras que nele não foram grafadas. O verbal a conviver com o não-verbal, a serviço da mesma causa, cumprindo o não-verbal o papel do silêncio-eloquente; ou seja, o silêncio que já não traduz a intenção do nada-dizer, mas que se faz silêncio mesmo para poder melhor dizer (p. 99-100).

Lembrei-me também das recomendações de alguns cronistas geniais que lia muito, diariamente. O maior do gênero sempre foi, sempre será Rubem Braga. Bastavalhe lembrar das mãos da mulher amada para reviver o amor inteiro, mais intenso.
Outro que estudei como estilo e métrica, não em conteúdo, foi Paulo Francis: cada
linha uma ideia, sem ser taquigráfico. Cada conjunto de ideias uma narrativa própria, em
quatro ou cinco linhas. Aí quebra.

Otto Lara Resende foi insuperável em seu “Bom dia para nascer”. Vinícius de Moraes tem livros e coletâneas – sim, também escreveu crônicas e canções que são crônicas cariocas.

Nelson Rodrigues é um explicador do Brasil: a classe média escravista e pervertida. Cony imaginava ser um Borges (igualmente cronista, articulista) e eu sempre preferi Gabriel Garcia Márquez: jornalista e cronista a contar a América Latina golpista.

Tenho ainda na memória as crônicas de Graciliano Ramos e de Machado de Assis. Clóvis Rossi fazia artigos romanceados – não era exatamente jornalismo de clima e nem literário. Mas, li muito, aprendi pra vida toda.

A terceira história é pessoal.

Como já falei demais, vou guardar essa para a próxima. Assim teremos mais assuntos para nossas conversas. Tudo bem pra você? Obrigado por ter lido até aqui, esta minha singela defesa da CF88.

A CF88 é o meu encantamento pela democracia e pelos direitos. Só que não é “o avesso do direito”, de Camus.

A CF88 é uma ideia que não termina, uma crônica anunciada para ser cumprida, um poema de amor pela liberdade e justiça. É a CF88 que me permite escrever para você.

Então, sendo assim, saúde e paz – como diz o amigo Cidoval.

E paz e ciência, nos dois sentidos da composição dos meus desejos para ti

A LUTA POLÍTICA PELA SAÚDE PÚBLICA

Vinício Carrilho Martinez (Dr.)
Professor Associado da UFSCar
Head of BRaS Research Group –
Constitutional Studies and BRaS Academic Committee Member

A primeira observação provém do profundo pesar e sentimento de solidariedade às vítimas que sofrem – direta ou indiretamente – os efeitos da pior crise política e caos institucional de nossa história, agravada pela, igualmente, pior e mais grave crise sanitária, humanitária, provocada pela pandemia COVID-19.

Assim, cabe-nos, preliminarmente, ressaltar que diante da gravidade da situação, com centenas de milhares de mortes (absolutamente evitáveis, em sua imensa maioria – mais ainda em 2021), que a formalidade ou a tecnicalidade (via de regra vazia de validade como sistema perito) foi suplantada, rapidamente, pela defesa intransigente da Ciência.

Afinal, entende-se, se o caminho é o da Prudência – como ensinavam os clássicos desde a Grécia e a Roma antigas –, que um debate, uma conversa, uma análise séria, efetivamente comprometidas com a Saúde Pública, no atual momento do nosso país, são merecedoras de muito mais do que uma simples digressão sobre conhecimento e Ciência.

Simplesmente porque o direito à vida de milhares e de milhões de brasileiras e de brasileiros não reside em absolutamente nenhuma tecnicalidade, mas sim, encontra respaldo e repouso na Ciência, no conhecimento crítico e no pensamento e na ação que se pautam pela Ética, pelo integral respeito aos direitos fundamentais.

Notadamente, como bem salientou o Supremo Tribunal Federal, em descrição típica de Aula Magna acerca dos direitos humanos, diante da saúde pública, do descalabro com que foi e vem sendo tratada pelo Executivo central (anímico e negacionista), é preciso respeitar a vida.

Em sessão do dia 8.4.2021 (ADPF 811), por incrível que pareça, o STF precisou decidir da ilegalidade das aglomerações em cultos e missas: como que dizendo-se sobre um Deus onisciente, para os crentes, que a sabedoria está na racionalidade, ou seja, na Ciência e na medicina que provê a Saúde Pública. Tratou-se da ADPF 811: basicamente,
a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental versa sobre a garantia de direito e de proteção contra decisões inconstitucionais.

Se há alguém aqui que possa discordar do que foi dito, sobretudo se efetivamente estiver vinculado a um Programa de Pós-Graduação em “Ciência, Tecnologia e Sociedade”, recomenda-se fortemente recuperar uma reflexão que formulamos na disciplina CTS 001: obrigatória, introdutória, mormente basilar, e, muito precisamente, denominada “Ciência Tecnologia e Sociedade”.

E qual é esta reflexão?

É simples: Não há Ciência sem prospecção, investigação, análise e reflexão
crítica.

Sem isso, repetem-se apenas os mesmos formulários burocráticos que nos apontam, invariavelmente, os mesmos resultados e as mesmas (in)conclusões. Ou seja, sem capacidade de olhar a “contrapelo”, que busque a raiz dos fatos e dos problemas, pelo viés do que se esconde ou se move pelas sombras (e a realidade nacional é exímia em “sombras”), escondidas, camufladas no pensamento e nas ações, (ações ou relações, individuais ou coletivas, como queria Max Weber), sem isso, não há construção lógica e validável (eticamente) do conhecimento.

Sem isso, o que se apresenta é o famoso acolchoado da inconsciência, da Ideologia – a pior pasmaceira e a mais nefasta inimiga da Ciência e de todos nós.

Agora, com profundo agravamento, ainda bem servida de Fake News, negacionismo, sonhos com Papai Noel e indescritível reprovação à vida humana – estando essa mergulhada em caos e submissão voluntária (diria La Boetie) aos interesses mercadológicos ou subtraída pelos mais nefastos e pavorosos interesses de um capitalismo, tipicamente brasileiro, aninhado entre o “pensamento” escravista e o seu ávido feitor de escravos – há muitas sobras para o Capitão do Mato.

Em suma, sem uma história muito bem contada, que remova as tais sombras – em claríssima aplicação do “método do meio-dia”, como queria Ortega Y Gasset – sequer teremos algum “sombreamento” acerca do que é Ética, Ciência e capacidade humana (forçosamente capazes) de promover e de prover o Processo Civilizatório.

Por fim, é necessário dizer que esta análise não é retórica, nem metafórica ou hiperbólica. Pois, os argumentos aqui reunidos pertencem ao mais simples nível do chamado realismo político e societal, sem invenção ou “intervenção” de qualquer natureza, sem nenhuma relevante descoberta.

É apenas um discurso sobre a Ciência que deve nos mover, mas sem a pretensão de, nesse momento, “Fazer-se Ciência”. Mas é, sim, um recado ou alerta aos negacionistas: num Programa de Pós-Graduação afinado com “Ciência, Tecnologia e Sociedade”, por óbvio, a Ideologia e a negação da realidade não são bem vindas.

Como se diz, se houvesse leitura atenta da Ideologia Alemã, a ideologia fascista não seria vencedora em pleno século XXI.

Aqui, pode-se dizer, cuida-se da “negação da negação”, e que, obviamente, é uma afirmação; a afirmação de que a vida de milhões de brasileiros e de brasileiras, especialmente pobres e negros, dependem exclusivamente da saúde pública e de seus instrumentos e aportes, começando pelo Sistema Único de Saúde – o nosso SUS.

Nosso SUS, do povo, não das elites ou de seus representantes ideológicos. Nesse item, finalizando com Gramsci, diríamos que almejamos formar o Intelectual Orgânico: sábio, na forma do Homem Médio em sua Vida Comum, preenchido de condição humanitária e transformador da realidade que nos abateu feito genocídio.

E o que é Ciência? Diria Bourdieu: é a luta armada.

Cada um(a) entende como quer, mas entendemos como luta armada de sonhos e de esperanças, de fé na coisa pública, em luta acesa e armada contra a desilusão, o atavismo, a ignorância programada e replicada, o obscurantismo negador do próprio Renascimento: essa areia movediça da anti-ciência.

Entendemos que é uma luta armada em defesa da Constituição Federal de 1988, em defesa da democracia, da República, do Estado de Direito. Lutamos pela sanidade, pela saúde pública das próprias instituições, pela dignidade humana e pela mínima capacidade cognitiva aplicada aos negócios públicos.

Sumariamente, entendemos como luta armada pelo “Direito a ter direitos” e legitimamente municiada contra toda e qualquer forma de obstrução prévia do conhecimento crítico, libertário, inclusivo e emancipador. Nos caberia, com folgas, a Educação após Auschwitz – de Adorno.

E, aqui, todos sabem que se fala da luta antifascista que orbita O Labirinto do Fauno, por onde anda o Alienista, os “bestializados” que ainda hoje promovem uma Revolta da Vacina, em 2021, e os macunaímas que teimam em negar o Abaporu – repleto de Vidas Secas.

A ninguém é atribuída a obrigação de concordar com tudo, mas a ninguém é dado o direito de alegar ignorância em face das restrições impostas a um suposto “direito de ir e vir”, pois há que se ficar, permanecer e respeitar o isolamento social.

A ninguém é dado o direito de negar a Ciência, como se recebesse uma carta em branco que viesse a se alimentar e servir-se como remédio antijurídico do próprio direito à vida e que, assim, ainda abastecesse essa gigantesca farmácia que pulula no WhatsApp – e seus fármacos envenenados de mentiras e de ódio social, já derrotando largamente o
famoso Dr. Google.

O capitalismo brasileiro, redescobrindo a cultura do “homem das cavernas”, investe contra Prometeu – o Patrono do Conhecimento e leva a crer que a morte é mais lucrativa do que a vida; por isso, investe-se em armas e não em vacinas. Por isso também não há “impedimento”, porque há muito mercado para a morte programada, planejada.
Essa é a experiência renitente do “nosso” Necrofascismo.

O Brasil, em 2021, vive (sobrevive) entre Pinochet e Thatcher – sempre soubemos combinar, perfeitamente, capitalismo e escravidão. Por isso, também, levaremos algum tempo para superar a negação da inteligência ou, ao inverso da negação, para a afirmação da cognição saudável.

Antigamente, ainda como modelo ideal, tratávamos de uma “inteligência política”; porém, no país atual, efetivamente, combater as iniquidades, e afirmar a inteligência meridiana, não é uma missão para amadores. Portanto, nosso convite sempre será para que se avalie Ciência, Tecnologia e Sociedade em total consideração à
democracia, aos direitos fundamentais, à dignidade humana.

A vida, se há saúde e inteligência na condução das instituições públicas, em contraste, exige a superação da Idiocracia que se mantém com as provocações do Democida instalado no poder. Por isso, não quero os Versos Tristes, de Neruda. Nós queremos saúde pública.

Referências


ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1995.
DEL TORO, Guillermo & FUNKE, Cornelia. O Labirinto do Fauno. Rio de Janeiro : Intrínseca, 2019.
GRACILIANO RAMOS. Vidas Secas. 91ª ed. Rio De Janeiro : Record, 2003.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. (Org. Carlos Nelson Coutinho). V. 2. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 2000.
MARX, Karl. O 18 Brumário e cartas a Kugelmann. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
MARTINEZ, Vinício Carrilho. Fascismo Nacional – Necrofascismo. Curitiba: Brazil Publishing, 2020.

(ps: Abertura da Aula Magna, como coordenador do PPGCTS/UFSCar, em 12.04.2021

EDUCAÇÃO CONTRA A MORTE

Uma Carta ao Povo e ao Patrono da Educação

Vinício Carrilho Martinez (Dr)
Professor Associado da UFSCar
Head of BRaS Research Group –
Constitutional Studies and BRaS Academic Committee Member

“Ninguém aprende com fome, aluno morto não melhora índice de avaliação, a educação é pra formar ser pensante que saiba que arma não mata vírus, e cidadãos conscientes de que não há salvador da pátria para resolver problemas estruturais do Brasil: educação para o mercado de trabalho desumaniza e retira as peculiaridades da identidade de nação” (minha amiga Janete – do grupo Juristas Antifascistas).

É assim que inicio, saudando todas as professoras e professores que, como a Janete, todos nós aqui reunidos, eu – por suposto –, enfim, todos e todas que se percebem estudantes, leitores e alunos de Paulo Freire.

Saúdo o professor Haddad, por suas lutas e conquistas.

Hoje, minha tese, depois do golpe de 2016, destaca o Fascismo brasileiro. Em 2018 tivemos grande prova disso, mas a partir de 2020 – com a pandemia e as centenas de milhares de mortes evitáveis (em sua imensa maioria) –, acirrou-se o problema e surgiu outro monstro: o Necrofascismo.

“Viva la muerte”, diziam os espanhóis falangistas, de Franco, naquele Labirinto do Fauno. Em nossa Luta pelo Direito, dizemos: Viva a CF88, a democracia e os direitos fundamentais do povo.

Porém, nesta nossa reinvenção do retrocesso, a cada dia vejo uma nova mistura da magia obscurantista: Um híbrido de Fascismo, guerra híbrida, necropolítica, pitadas verdes e amarelas de cesarismo e de bonapartismo, e que, obviamente, programam e provocam o pior genocídio de nossa história.

O Necrofascismo, como se sabe, retroalimenta-se do bolsonarismo: um fenômeno que recriou os capitães do mato,
repaginou o Alienista e seus macunaímas, armados de ódio e capazes de consumir a mínima lembrança e interpretação humanista de Abaporu.

Mas, contra isso, queria citar Cora Coralina:

“Faz da tua casa uma escola!
Lê, escreve, desenha, pinta, estuda, aprende, ensina…
Faz da tua casa
Um local criativo de amor”.

Gosto dessa poesia, que é do povo, direta, simples, singela como uma avó falando com seus netos. Como fez Paulo Freire, com sua consciência retrospectiva e avalista do futuro libertário.

E é por isso que, em 2022, gostaria muito de ver os recursos do Pré-Sal serem utilizados integralmente na educação pública de qualidade, crítica, emancipadora e antifascista. E assim concluo, parafraseando Umberto Eco e Adorno.

Nós aqui dizemos: viva a educação para a esperança, para o entendimento histórico e científico do que é o obscurantismo, para a luta que preserva a vida e os direitos fundamentais do povo, dos pobres,
dos negros, das crianças, das mulheres, dos idosos, dos deficientes físicos, da natureza.

Viva toda educação que combate o genocídio, que estimula o “Direito à Consciência do Processo Civilizatório”. Viva Paulo Freire e o “direito de sonhar”.

Referências
ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1995.
DEL TORO, Guillermo & FUNKE, Cornelia. O Labirinto do Fauno. Rio de Janeiro : Intrínseca, 2019.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo : Editora UNESP, 2000.
GRACILIANO RAMOS. Vidas Secas. 91ª ed. Rio De Janeiro : Record, 2003.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. (Org. Carlos Nelson Coutinho). V.

  1. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 2000.
    HABERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição – contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Sérgio Antonio Fabris Editor : Porto Alegre, 1997.
    MARTINEZ, Vinício Carrilho. Bolsonarismo: alguns aspectos políticojurídicos e psicossociais. Curitiba: Brazil Publishing, 2020.